Book Reviews

22 abril, 2006

37) Perfis biograficos brasileiros: nova colecao de livros

Um retrato nada oficial do Brasil
Coleção Perfis Brasileiros reúne biografias pouco convencionais de políticos, escritores e artistas
Antonio Gonçalves Filho

Nos últimos três ou quatro anos o mundo foi inundado por um tsunami de biografias de Napoleão, mas só uma, ao que se tem notícia, foi parar na mesa de cabeceira do presidente George Bush: a do acadêmico Paul Johnson, único a dizer com todas as letras que o general francês foi o precursor dos ditadores modernos e dos estados totalitários. Pois foi justamente a biografia de Paul Johnson, lançada lá fora há quatro anos, que inspirou o jornalista Elio Gaspari e a historiadora Lilia Moritz Schwarcz a conceber e coordenar a coleção Perfis Brasileiros, série de biografias de líderes, escritores e artistas que a Companhia das Letras coloca hoje nas livrarias de todo o País. (preços entre R$ 33 e R$ 38).
Johnson é uma figura controvertida por apoiar a política externa do presidente Bush, mas ninguém discute sua biografia de Napoleão. Ele conta com extraordinária habilidade a carreira e a vida do general francês que, no começo do século 19, levou jovens filhos de fazendeiros a morrer por uma causa injusta - a sua, de criar um império maior que a vida.
Nas quatro primeiras biografias da nova série Perfis Brasileiros não há nenhum militar ou político tão ambicioso como Napoleão, mas Maurício de Nassau bem que tentou criar no Brasil um paraíso capitalista durante a ocupação holandesa. Nassau desembarcou no Recife há 369 anos na condição de governador. Não conseguiu impor sua ideologia protestante, privatista e racionalista, concorrendo com a portuguesa, católica, estatal e burocrática. É justamente em torno desse conflito que se move o historiador Evaldo Cabral de Melo, um dos maiores especialistas no assunto ocupação holandesa.
Ao contrário de Paul Johnson, que entra no quarto de Napoleão e Josefina para explicar o comportamento do general na guerra, Cabral de Melo deixa a vida privada de Nassau para outro historiador. Solteiro, amante da pintura e da arquitetura, o nobre humanista não desperta a mesma atração de, por exemplo, D. Pedro I, outro biografado da série, mulherengo e casca grossa. A historiadora Isabel Lustosa, autora de Insultos Impressos (Companhia das Letras), retrata o imperador com traços expressionistas. O título da biografia, D. Pedro I, Um Herói sem Nenhum Caráter, define sua filiação andradiana ao identificar o imperador com o malandro Macunaíma.
Ao contrário dos livros da história oficial, o imperador é reduzido à condição de governante medíocre, que fazia vista grossa à corrupção - não é familiar? - e tratava suas muitas mulheres de modo rude. É claro que a autora não esquece o papel de Pedro I como forjador do futuro do país, mas lembra que, desde pequeno, já esboçava uma personalidade tirânica e contraditória.
A biografia do imperador aproxima-se do modelo Paul Johnson no quesito ambigüidade (dos biografados, claro). A historiadora e antropóloga Lilia Moritz Schwarcz justifica sua admiração pela forma com que Napoleão foi retratado pelo historiador e jornalista inglês. "É uma biografia com argumento", resume, anunciando os próximos projetos da coleção, um livro sobre o artista plástico carioca Hélio Oiticica (1939-1980) escrito por Nicolau Sevcenko, outro sobre a atriz carioca Leila Diniz (1945-1972) que está nas mãos de Joaquim Ferreira dos Santos, um perfil do imperador D. Pedro II por José Murilo de Carvalho e ainda um outro sobre o marechal Rondon, a cargo do americano Todd Diacon, diretor do Departamento de História da Universidade do Tennessee.
Diacon é autor de um livro essencial para o entendimento da formação do Brasil moderno, justamente sobre a vida de Rondon. Na primeira leva de biografias da coleção Perfis Brasileiros , o papel de moderno cabe ao poeta Castro Alves, analisado pelo africanista e membro da Academia Brasileira de Letras Alberto da Costa e Silva. Não se trata de um retrato idealizado do autor de O Navio Negreiro. O acadêmico e embaixador pinta com equilíbrio a figura do republicano libertário que, com certeza, teve um papel decisivo na libertação dos escravos, mas observa que esse foi um amor à distância. O poeta pouco sabia da vida e costumes dos negros submetidos ao cativeiro. Preferia correr os bares de lábios pintados e com muito pó no rosto.
Se Castro Alves foi um dândi rebelde e com causa, Getúlio Vargas foi um homem "acossado por dúvidas existenciais", segundo a biografia escrita pelo estudioso Boris Fausto, certamente o maior especialista brasileiro na Revolução de 30. O grande desafio do autor é entender como um político provinciano chegou ao papel de ditador simpático, inclinado ao fascismo e estranhamente cultuado pela esquerda. O título da biografia, O Poder e o Sorriso, resume a figura paternalista do líder de massas que até hoje marca os políticos deste país, especialmente pela astúcia.
A despeito disso, Fausto nota que a imprensa, de modo geral, enaltece o estadista e prefere esquecer o autoritarismo e o populismo da Era Vargas. O caudilho nasceu na monarquia e deixou o Brasil republicano com um enigma para resolver. Como dizia, gostava mais de ser interpretado do que se explicar. Boris Fausto assume a tarefa, mas não é sua culpa se até hoje ninguém entende como um homem que odiava comunistas aproximou-se depois do PCB e este de seu "perseguidor implacável". Como se vê, cada biografia revela homens contraditórios, de um imperador sem classe a um poeta abolicionista que pintava a África como um cenário protohollywoodiano.
Lilia Schwarcz e o jornalista Elio Gaspari fizeram uma "lista dos sonhos", segundo a historiadora, para cruzar os personagens biografados com os autores certos. "Queríamos contrapor esses perfis inesperados ao modelo historiográfico positivista do século 19", justifica Lilia, concluindo que "só autores de muita personalidade e estilo" poderiam dar conta da missão nada fácil de escrever sobre personagens tão complexos. Não se trata de um caprichoso revisionismo, mas de tentar entender, por meio dessas vidas, como o Brasil evoluiu com tantas empreitadas destinadas ao aparente fiasco.
(O Estado de São Paulo)

36) Globalmente desiludido?

The New York Review of Books, vol. 53, Number 7, April 27, 2006

Review
The Global Delusion
By John Gray

Globalization and Its Enemies
by Daniel Cohen, translated by Jessica B. Baker
MIT Press, 192 pp., $27.95

How We Compete: What Companies Around the World Are Doing to Make It in Today's Global Economy
by Suzanne Berger and the MIT Industrial Performance Center
Currency/Doubleday, 334 pp., $27.50

End of the Line: The Rise and Coming Fall of the Global Corporation
by Barry C. Lynn
Doubleday, 312 pp., $26.00

1.
For the past two centuries leading social theorists have believed that modern development can have only one outcome. In the nineteenth century Karl Marx, Herbert Spencer, and Auguste Comte asserted that the advance of science and technology was leading to a single type of social organization, and unless modern societies foundered in a reversion to barbarism they were bound to converge in a global system. There was wide disagreement on the nature of the system that was coming into being. According to Comte it would be a kind of technocracy, while Marx believed it would be egalitarian communism and Spencer laissez-faire capitalism. In each case it was a version of industrial society that enabled scarcity in the necessities of life to be overcome. Despite their different political visions these thinkers were at one in assuming that with the advent of industrialization prosperity could be ensured for all. Once this had been achieved, war would cease and a universal economic system would replace the diverse and conflicting regimes of the past.

Similar beliefs shaped the thinking of many twentieth-century social theorists. In the Thirties F.A. Hayek resuscitated a version of Spencer's theory of the free market as the endpoint of social evolution, while Sidney and Beatrice Webb believed an early version of the universal society of the future was embodied in the Soviet Union. During the Sixties theorists of the "end of ideology" such as Daniel Bell anticipated that centrally planned economies and market-based affluent Western societies would come together in a managerial mixed economy. Toward the end of the century the idea became fashionable that societies everywhere were embracing "democratic capitalism."

None of these expectations has been borne out by events. Industrialization is spreading everywhere, but at varying rates of rapidity and with disparate consequences. As in the past, societies are developing in widely different directions. In parts of the world the state has foundered and been replaced by anarchy; in others authoritarian regimes remain strongly entrenched. The former Soviet Union converged with the third world rather than the affluent West and has been replaced not by liberal democracy but by a hyper-modern version of traditional Russian authoritarianism.

Versions of liberal democracy have spread into parts of the former Soviet bloc, but in Iraq democracy is producing a type of elective theocracy not unlike that which exists in Iran. China has abandoned central economic planning for a type of state capitalism closely linked with nationalism. Some countries are moving toward market reform and others in the opposite direction. Europe has opted for a combination of social democracy with a neoliberal economic system, while under the Bush administration the United States has tilted toward a mix of protectionism, an unsustainable federal deficit, and crony capitalism.

Though the world's diverse societies are continuously interacting, the proc-ess is producing a variety of hybrid regimes rather than convergence on a single model. Yet a belief that a universally accepted type of society is emerging continues to shape the way social scientists and public commentators think about the contemporary condition, and it is taken for granted that industrialization enables something like the way of life of rich countries to be reproduced everywhere.

The assumption of convergence is evident in theories of globalization. In The Borderless World (1990), the influential management theorist Kenichi Ohmae declared:

[The global economy] is becoming so powerful that it has swallowed most consumers and corporations, made traditional national borders almost disappear, and pushed bureaucrats, politicians, and the military toward the status of declining industries.[1]
Ohmae's work embodies what may be called the business-utopian model of globalization, but the idea that national systems of government are becoming marginal is shared by theorists of cosmopolitan governance who believe that powerful new supranational institutions are emerging—a view that is no less unreal. Similarly anticapitalist movements are based on the premise that the divergent patterns of development of the past have been replaced by a new, repressive global system. Supporters of globalization and many of its critics assume that it creates similar conditions wherever it spreads. Whether they welcome the prospect or resist it, both accept that global market forces are forcing societies onto the same path of development.

In Globalization and Its Enemies, Daniel Cohen, a professor of economics at the École Normale Supé-rieure in Paris, provides a refreshing antidote to some of the most misleading features of this consensus. His starting point is the seemingly paradoxical claim that for most people in the world it is not a reality but a mirage. As Cohen sees it, the ongoing wave of globalization—the third in a series that began in the sixteenth century with the conquistadors and continued in the nineteenth with British imperial free trade—occurs largely in a realm of virtual reality and leaves much of everyday life untouched. Nineteenth-century globalization involved large-scale movements of population to new lands, while the present phase involves mainly commodities and images.

"Today's globalization," he notes, "is 'immobile.'" Goods are produced and marketed on a planetary scale but those who live in rich countries encounter other societies chiefly through television and exotic vacations. There are politically controversial migrations of poor people from the Middle East and Africa to Europe and from Mexico to the United States, but immigrants still make up only around 3 percent of the world's population today, whereas in 1913 it was about 10 percent. Again, trade has expanded greatly in the past thirty years but a great deal of it occurs between rich countries. The fifteen longstanding members of the European Union make up around 40 percent of global commerce, but two thirds of their imports and exports are traded within Europe itself. As Cohen puts it, "in wealthy countries globalization is largely imaginary."

The belief that financial globalization is promoting economic development in poor countries is also delusive. Global financial markets have few incentives to equip poor countries to be globally productive. It may be profitable to computerize a grocery store in New York, but in Lagos customers are too poor to pay the prices required by such investment. The result is that technology is very unevenly diffused, and the poor stay poor.

However, the reason is not that rich countries are victimizing poor countries. The poverty of developing countries is often blamed on unfair terms of trade, and there can be little doubt that protectionist practices in agriculture both within the EU and in the US, for example, have hindered poor countries; but Cohen argues that on the whole trade is not as unequal as has been widely thought. The basic reason that poor countries stay poor is that they have little that rich countries want or need.

"To understand today's globalization," he observes dryly, "requires that one renounce the idea that the poor are stunted or exploited by globalization." The poor of the world are not so much exploited as neglected and forgotten. At the same time the press and television are drenching them with images of the riches they lack. For the poor, globalization is not an accomplished fact but a condition that remains to be achieved. The irony of the current phase of globalization is that it universalizes the demand for a better life without providing the means to satisfy it.

Globalization and Its Enemies
is one of the most original and incisive inquiries into the subject I have seen. No one who reads and understands it can come away believing that the current phase of this complex and uneven process is leading to the peaceful universal market of business utopians, or accept the simple narrative of anti-capitalist movements in which underdevelopment is a consequence of the wealth of advanced countries. There is more wisdom in Cohen's short book than in dozens of weightier tomes; but there are some disconcerting lacunae in the analysis.

Cohen is far more conscious of the material environment in which industrial production takes place than most other economists. Globalization and Its Enemies has some fascinating discussions of the geographical and climatic conditions favoring or retarding economic development and the continuing importance of population growth. For example, Cohen notes the worsening relationship between fast-growing human numbers and available arable land. In 1913 Egypt had only 13 million inhabitants, today it has 70 million, and in 2025 it is expected to have over 100 million; but only 4 percent of Egypt's land is arable.

It is all the more surprising, then, that Cohen gives very little attention to globalization's environmental limits. In a number of asides he acknowledges that the current phase may be endangering the planet's ecological equilibrium. "One cannot continue for long," he observes, "leaving to private regulation the question of global warming, the opening of the ozone layer, or the disappearance of species." Yet Cohen seems not to see clearly that ecological instability is an integral part of the vast economic change that is currently underway. As an example, China is undergoing the largest and quickest industrialization in history. At the same time it is suffering unprecedented levels of pollution. Environmental crisis and the present phase of globalization are different sides of the same process.

Cohen argues that the present phase of the world economy involves a shift from an industrial to a post-industrial economy: while around 80 percent of global trade is in industrial and agricultural products, industry and agriculture account for only around 20 percent of employment in rich countries with the service sector providing about 80 percent. For developing countries, however, the current wave is simply another phase in the worldwide process of industrialization that began some centuries ago. The disturbance in the planetary environment we are currently witnessing is a by-product of this process, whether in rich countries or poor.

There can no longer be any reasonable doubt that the global warming the world is experiencing today is a side effect of fossil fuel use. The extraction and consumption of hydrocarbons has been integral to industrialization and remains so; but it is also the chief human cause of planetary overheating. A clear correlation exists between industrialization over the past 150 years and rising greenhouse gases. There is some uncertainty in estimates of when climate change will begin to disrupt the industrial civilization that has spread, in different forms, throughout much of the world; but observation of rapid melting in the Antarctic ice cap and the worsening prognosis of the Intergovernmental Panel on Climate Change suggest that a major climate shift is underway that could have a severe impact on the way we live. It is easy to dismiss projections of looming environmental disaster as apocalyptic doom-mongering, and carry on with business as usual. Mounting evidence, however, suggests a growing possibility of an abrupt climate change in which rising sea levels will flood many of the world's coastal cities and damage large areas of arable land. In such conditions there would be serious conflicts over dwindling resources of food, water, and energy supplies together with large-scale population movements as millions flee areas that are no longer humanly habitable.

Until very recently these have been worst-case scenarios. When an analysis of th consequences of abrupt climate change commissioned by the Pentagon and complete in October 2003 was leaked to the British press in February 2004, it was criticized a being based on unreasonably pessimistic assumptions about the scale of the climati shift that is underway [2] The report suggested that impending climate change threatens to reduce the planet's capacity to sustain its present human population and trigger acute resource wars, and recommended that the challenge this presents be treated as a matter of US national security. Both the analysis and the recommendation were shelved by the Bush administration. However, only a few years later accumulating scientific research leaves predictions of large-scale disruption of economic activity and intensifying geopolitical conflict of the kind the Pentagon report envisaged looking increasingly realistic.[3]

The global warming we are experiencing today is a byproduct of globalization, and so is rivalry among states for control of natural resources. Advancing industrialization means increasing emissions from power plants and automobiles; it also means increased competition for the fossil fuels that make industrialization possible. Cohen writes that until World War I industrial countries themselves produced most of the raw materials they needed, and until the 1930s they were more or less self-sufficient in energy. "It was only due to the role played by Middle East petroleum after World War Two," he writes, "that the scheme was reversed." It is a decisive caveat. The Gulf War of 1990–1991 demonstrated unequivocally the continuing pivotal role of Middle Eastern petroleum in the global economy. Despite moves in some countries to develop a broader mix of energy supplies, industrial societies everywhere are dependent on depleting reserves of oil and natural gas.

Moreover, demand is inexorably increasing as globalization advances in China, India, and elsewhere. States are competing for dwindling resources, with the result that classical geopolitics is once again central in international relations. In the nineteenth and twentieth centuries, social theorists and economists believed that industrialization made possible a new global system in which scarcity in the basic requirements of life would no longer exist. Instead worldwide industrialization is reproducing the resource conflicts of the past on a larger scale.

The conjunction of intensifying scarcity in energy supplies with accelerating climate change is the other face of globalization. It poses a large question mark over Cohen's belief that the main problem with globalization is that it is incomplete, for it suggests that completing it may not be feasible. The current phase is only the extension to the wider world of the industrial revolution that began in England a couple of centuries ago, but already it is destabilizing the environmental systems on which all industrial societies depend. Extending the energy-intensive lifestyle of the rich world to the rest of humankind would have an even more destabilizing impact.

At the same time—and contrary to some antiglobalization theorists—there is n prospect of humanity opting to revert to a pre-industrial way of life. Such a choic would run counter to the aspirations of billions of people, and industrialization i China and India has an impetus that no government can resist. In any case it i doubtful that a human population of around eight or nine billion—the figure that i commonly projected for the middle of the present century—could be sustained by pre-industrial methods. Even if the present human population could be supported for time by such methods, it would only be by devouring what remains of wilderness i the world and further destabilizing global climate systems.

As the reverse side of globalization, environmental crisis could well derail it. If there is a way forward it lies in the intelligent use of science and technology to develop less dangerous sources of energy; but it is a mistake to think that a large change in the way we live can now be avoided. Climate change cannot be prevented, only mitigated, and whatever is done to deal with its effects there is sure to be large-scale disruption and conflict. The defining feature of the industrial civilization that is spreading everywhere is exponential growth; but such growth is eventually self-limiting.

Cohen's analysis is refreshingly heretical, but like nearly all economists he resists this conclusion. He distinguishes two kinds of economic growth—the "Smithian" variety that reflects Adam Smith's vision in The Wealth of Nations, in which growth is achieved by utilizing the benefits of the division of labor, and a "Schumpeterian" variety that is driven by continuous technological innovation. In an unexpected lapse into economic orthodoxy Cohen maintains that while growth of the first kind ends by exhausting itself, "Schumpeterian growth is apriori without limit."

However, while these types of growth differ in important respects, they are similar in requiring large inputs of energy that in present conditions can only come from oil and its derivatives—resources that are not only finite but whose large-scale use has the effect of stoking up greenhouse gases. (The use of nuclear fusion to supply energy would avoid that outcome but there seems no clear prospect that it will be developed anytime soon, and it would not prevent the climate shift that is already underway.) An economy based on technological innovation is better placed than others to respond to these challenges but it cannot detach itself from the material environment of the planet. Both sorts of growth rely on fast-depleting resources and face the ecological backlash of climate change. The irony of globalization runs deeper than Cohen has perceived. Not only is it at present more imaginary than real, it can never be fully achieved.

2.
One of the many valuable features of Suzanne Berger's book How We Compete is its healthy skepticism regarding claims that different models of economic development ultimately converge. As Berger writes, there is broad agreement on the fundamental forces driving globalization:

a great freeing up of trade and capital flows; deregulation; the shrinking cost of communication and transportation; an [Information Technology] revolution that makes it possible to digitize the boundaries between design, manufacturing and marketing and to locate these functions in different places; and the availability of large numbers of workers and engineers in low-wage countries.
Convergence models assume that once globalization is in place, the only way companies can adapt is by adopting the same business practices. In this view globalization is self-reinforcing. But as Berger notes, it is not a view borne out by history. The global economy that existed prior to World War I was in many respects more open and borderless than the one that exists today. Even so it collapsed, and in a process culminating in the US in the Smoot-Hawley tariff law of 1930 was replaced by the semi-autarchic closed economies of the interwar years. However securely established it may seem, globalization is not irreversible. Indeed, over time its disruptive effects tend to result in deglobalization.

Standard models assume that globalization means that one way of doing busines will be imposed on everyone, but this is not supported by Suzanne Berger's researc on many companies in different parts of the world. She writes that the common belie is that "globalization forces everyone onto the same track. But that's not what our tea found." Drawing on a five-year study by the MIT Industrial Performance Center Berger presents a wealth of evidence about the different strategies adopted by fiv hundred international companies to survive and prosper in the global market. Th result is a consistently enlightening analysis that explores the many different ways i which companies respond successfully to global competition. The computer compan Dell is strongly focused on distribution and outsources all manufacturing o components overseas, for example in India, while Samsung makes almost everythin itself; but both are rapidly growing, profitable businesses. General Motors is finding i difficult to adjust to high-wage labor, while Toyota—which has kept production a home or in other advanced countries—is doing well. Faced with similar challenges companies can thrive or fail in different ways

Devoting a significant part of her analysis to the dilemmas surrounding outsourcing, Berger concludes that the threat of continuing job losses in the US is at least partly real. Many economists insist that as old jobs are lost, new technologies and industries will appear to replace them. Berger does not entirely reject this view, but suggests that the experience of those who have been laid off and cannot find jobs without accepting large reductions in pay may point to a trend that mainstream economics has missed: "After crying wolf so often, perhaps this time the pessimists about technological advance and employment have really spotted one." Outsourcing poses a real risk to employees; but Berger believes a "race to the bottom" can be avoided if companies accept that employing cheap labor is not the most effective way of responding to global competition. The activities that succeed over time are those that involve conditions —such as long-term working relations with customers and suppliers and specialized skills—which companies whose main asset is cheap labor cannot match. A company policy of forcing wages down is not a recipe for long-term corporate success.

Berger is clear that acting on their own, companies cannot make all the needed adjustments. Governments have a major part in creating an environment in which businesses can plan for the future, but how governments do this will depend on the type of capitalism they must deal with. As she acknowledges in a lucid discussion, capitalism comes in several varieties reflecting different cultural traditions and political systems. Within this wide variety two different kinds of market economy can be distinguished:

liberal market economies, like Britain's and the United States', in which allocation and coordination of resources takes place mainly through markets; and coordinated market economies, like Germany's and Japan's, in which negotiation, long-term relationships, and other nonmarket mechanisms are used to resolve the major issues.

These divergent capitalisms are competing and they learn from one another but the result is cross-fertilization, not evolution toward a single model. What works well varies not only from company to company but also from country to country. There is no one set of policies or institutions that can yield prosperity in all societies—or for all companies. The belief that globalization means the triumph of one way of doing business is not only historically false. It is a dangerously mistaken basis for corporate strategy. As Berger puts it, summarizing the results of the years of research conducted by her team:

"Succeeding in a world of global competition is a matter of choices, not a matter of searching for the one best way—we discovered no misconception about globalization more dangerous than this illusion of certainty."

The belief that nation-states remain pivotal in global society is one of the centra theses of Barry C. Lynn's powerful polemic, End of the Line. In a wide-ranging and thoroughly researched argument, Lynn challenges the belief that by increasing interdependence among the world's economies globalization thereby enhances their stability. On the contrary, it is having the effect of reducing stability —not least in the United States. "Fifteen years of turbo-charged 'globalization' of industry, unchecked by any American state strategy or vision, has left the American people relying on a global industrial 'commons,'" Lynn declares, "that is largely out of their control and that is riven by fundamental structural flaws."

For Lynn the core of globalization is not a global market, which has long existed in many commodities. It is the global organization of production, which now takes place in far-flung networks that no one controls or really understands. A company such as Wal-Mart has become highly successful by outsourcing, buying billions of dollars of goods from China, for example. It "perceives no need even to understand the processes of supply and of production, let alone manage them carefully for the long term." When production is globally outsourced, more and more companies become trading and retail vehicles, with neither the ability nor the interest needed to manage the process of production. Not only production but management has been devolved, with the result that no one has an overall view. It is this feature of the global economy—lauded by those who value the market for its ability to achieve results no one has planned—that Lynn finds most alarming. Because the global production system transcends national boundaries, no one is responsible for ensuring that it is safe: "Nobody looks for risk in the system...nobody accepts any liability for risk in the system."

As Lynn notes, the failure to confront the risks of global production is partly owing to the anachronistic revival of classical liberal ideologies in which it is believed that free trade promotes peace. In his celebrated book The Great Illusion, Norman Angell argued that growing economic interdependence made war unprofitable and improbable—a view that had been advanced in the nineteenth century by enthusiasts for free trade such as Richard Cobden. Angell's tract was published in 1909 and its argument was overturned five years later by the outbreak of the most destructive war in history. But the belief persists that as the economies of different nations become more integrated with one another their political systems will become more democratic, with the result that the world becomes more peaceful.

In practice, increasing global economic integration often works the other way. Lynn observes that because of the strong economic links between the two countries, a democratic upheaval in China would be highly destabilizing for the American economy. If ports in China were shut down or production plants closed—whether by the Chinese government or as a result of popular dissent—the flow of goods to the American economy would be severely disrupted. In such circumstances the US could well find itself propping up the current regime in Beijing: "If anything, to protect our supply lines, we may find ourselves cooperating with Beijing hard-liners to suppress the will of the Chinese people."

The long supply lines of the global production chain extend into many countries ruled by authoritarian regimes. Any serious threat to these regimes will have global repercussions, and it will not be easy for democratic states to side with dissident movements. Free trade requires stability more than democracy, and this is especially true when production is globally dispersed. At the same time, stability is not ensured in the current state of international affairs. As in the past, states have divergent strategic objectives; they prize their own security highly and will seek to thwart global market forces if they seem to threaten what are seen as vital national interests. It is only reasonable to expect that these differences will sometimes lead to conflict.

Insofar as it is a prescription for policy, End of the Line is a plea for a reassertion of American national interests. Unlike many analysts in America and other countries, Lynn—a senior fellow in the New America Foun- dation—recognizes that the present global economic regime is not a spontaneous growth. It is largely an artifact of American power, which was constructed in the belief that it would serve American interests. But the system that has been established does not always work to America's advantage, nor is it self-stabilizing:

"The global economy was created by the American state. Absent a clear-minded effort by the United States to manage this system—in ways amenable to the large majority of the peoples around the world who now depend on it—it will slowly fall to pieces."

Lynn's proposals for policy change are wide-ranging, but their common feature is that they represent a clear shift from the naive faith in the benign effects of global market forces that has shaped American policy since the end of the cold war. Here his analysis is symptomatic of an ongoing shift in opinion. The steadily deteriorating prospect in Iraq and the negative impact of outsourcing are undermining public faith that globalization works overall in the American interest. In conjunction with the spiraling cost of the war, this change in mood could well shift US policies in a more inward-looking direction. Having led the world to globalization, the US may not be far from taking the lead in retreating from it.

Models of economic development that anticipate societies converging in a harmonious universal system have deep roots in Western thinking. It is not surprising that they should have been revived in theories of globalization in the aftermath of the cold war; but they reflect the conditions of the nineteenth century, when the environmental limits of industrial expansion were hardly suspected. They fail to take account of the fact that industrialization on a global scale intensifies scarcity in vital natural resources while triggering a powerful ecological backlash. These developments, which form the other side of globalization, will shape its future course.

Notes
[1] The Borderless World: Power and Strategy in the Interlinked Economy (HarperBusiness, 1990), p. xi.

[2] An account of the contents of the report appeared in The Observer, London, February 22, 2004. The report, "An Abrupt Climate Change Scenario and Its Implications for United States National Security," by Peter Schwartz and Doug Randall, is widely available on the Internet.

[3] See Jonathan T. Overpeck and Bette L. Otto-Bliesner et al., "Paleo-climatic Evidence for Future Ice-Sheet Stability and Rapid Sea-Level Rise," Science, Vol. 311, No. 5768 (March 24, 2006), pp. 1747–1750. The authors summarize their findings by stating: "Recent scientific research suggests polar warming by the year 2100 may reach levels similar to those of 130,000 to 127,000 years ago that were associated with sea levels several meters above modern levels." Using a computer model, the authors found that climate change is likely to make the world between 3 and 5 degrees centigrade warmer later this century. Professor Overpeck, director of the Institute for the Study of Planet Earth at the University of Arizona, has stated that with a one-meter rise in sea level, the Maldives would disappear, most of Bangladesh would be uninhabitable, and cities such as New Orleans would be "out of business." The Guardian, March 25, 2006.

21 abril, 2006

35) Uma homenagem ao livro, por um escritor argentino

Transcrevo, para os que gostam de livros, um texto estimulante, uma verdadeira ode aos livros e à leitura, escrita pelo autor de "Santa Evita", o argentino Tomás Eloy Martínez (e agradeço a meus colegas da lista "Diplomatizando" sua transmissão):

"El libro y no la espada fue lo que creó el país"

El siguiente es el texto completo del discurso con el que el escritor argentino Tomás Eloy Martínez dejó inaugurada ayer la 32a. Feria Internacional del Libro. En su mensaje, el autor de "Santa Evita" lamentó la ausencia del presidente de la Nación, Néstor Kirchner

"Antes aun de que aprendiera a leer, cuando me esforzaba por desentrañar el significado que ocultaban las formas de las letras, le formulé a mi padre una pregunta que él me repitió poco antes de morir, porque en su momento no la supo contestar, como yo tampoco sabría hacerlo ahora: ¿somos nosotros quienes creamos las palabras que nombran las cosas de la realidad o las cosas nacen de las palabras que las nombran?
Los filósofos y semiólogos han respondido de muchas maneras a esa cuestión que acabo de formular tan torpemente como en la infancia, pero la duda nunca dejó de estar ahí. Sé –al menos, eso sé– que avanzamos en la selva de lo desconocido asociando palabras. Leemos para imaginar. Leemos para aprender cómo es la respiración del mundo. Y, a veces, también leemos para descubrir que el mundo no respira como imaginábamos, sino de otra manera. Todo y todos somos, a cada instante, otros. Si no supiéramos leer, tampoco sabríamos pensar.
Escribir viene después. La escritura es la envidia sana de la lectura o, más bien, el deseo de prolongar la lectura indefinidamente. Alguna vez he contado que escribí mi primer relato a los nueve o diez años, para salvarme de la prohibición de leer que mis padres me impusieron como castigo durante un mes por un delito de desobediencia. Pero aquello que escribí era sólo un resumen de lo que había leído, un magma en el que el mundo no era como era, sino como a mí me parecía que debía ser. Tiempo después, leyendo a Walter Benjamin, aprendí que hay cierta ansiedad en todo narrador por ser otro, por estar en otros: "Narrar no sólo es significativo porque nos permite asumir o dibujar un destino ajeno, que a la vez nos educa -dice Benjamin-. Es significativo porque ese destino ajeno, gracias a la fuerza de la llama que lo consume, nos transfiere el calor que jamás obtenemos de nuestro propio destino". En las ficciones somos lo que soñamos y lo que hemos vivido, y a veces somos también lo que no nos hemos atrevido a soñar y no nos hemos atrevido a vivir. Las ficciones son nuestra rebelión, el emblema de nuestro coraje, la esperanza en un mundo que puede ser creado por segunda vez o que puede ser creado infinitamente dentro de nosotros.
El primer libro completo que leí en mi vida fue una colección de cuentos de los hermanos Grimm, de la editorial Molino, con unas ilustraciones que acentuaban el terror de aquellas historias melancólicas, en las que nada nunca se lograba por completo, ni la felicidad ni la derrota del mal. Más tarde, entre los siete y los nueve años, me convertí en un devoto sin remedio de las novelas de Alejandro Dumas y de Julio Verne. Cada vez que he tenido en la vida una situación de desesperanza -y vaya si las he tenido: enfermedades, exilio, pérdida de personas amadas-, volví a esos libros de la infancia para que me devolvieran la fe en que todo regresa, de una manera u otra: todo puede ser recuperado. Así, he releído por lo menos cuatro veces dos novelas de construcción perfecta, El conde de Montecristo y La reina Margot, a las que sigo buscándoles en vano los lunares de arquitectura que no tienen.
En la adolescencia, los bibliotecarios me parecían extensiones de Dios, herederos de un saber inagotable. Todas las mañanas iba en busca de libros a la biblioteca Sarmiento de Tucumán, cien metros al norte de la Casa de la Independencia, y mientras devolvía los préstamos del día anterior les pedía consejo sobre las lecturas siguientes. Gracias a ellos, alcancé, entre los once y los dieciocho años, el inolvidable conocimiento de Heródoto, de los diálogos de Platón; leí el Edipo rey de Sófocles, las seis grandes tragedias de Shakespeare, los poemas de Góngora y de Quevedo, las Novelas ejemplares de Cervantes y, por supuesto, el Quijote. Por las noches, nos bañábamos con mis amigos en las aguas purificadoras de la poesía más nueva. Atravesábamos como poseídos los mares de lágrimas de César Vallejo para subir después a las montañas de Neruda, o bajar hacia los valles de Rilke, de Mallarmé, de Baudelaire, de Cernuda, como si las voces del mundo fueran en verdad una sola voz inagotable. En el invierno de mis trece años me enfermé de una tuberculosis imaginaria por identificarme con los personajes de La montaña mágica, de Thomas Mann. Poco después, las ficciones de Faulkner me produjeron insomnios recurrentes. Uno de los visitantes de la biblioteca me recomendó entonces que leyera El proceso, de Franz Kafka, porque nadie podía, según me dijo, resistir el sopor del primer capítulo. El falso remedio agravó mi enfermedad. Apenas puse un pie dentro de Kafka, entré en un laberinto del que no he salido todavía, yendo de La metamorfosis a La condena y de El castillo a la Carta al padre. Y, por supuesto, en las orillas de esos sistemas solares estaba Borges, construyendo dentro de mí su propia galaxia.
Somos, así, los libros que hemos leído. O somos, de lo contrario, el vacío que la ausencia de libros ha abierto en nuestras vidas.
Todas las grandes culturas se han creado en torno de un libro sacramental: ya sea el Pentateuco, la Torah, los Evangelios, el Shu y el Yi de Confucio, el Buddhavacana canónico de los budistas, el Chilam Balam y el Popol Vuh de la América anterior a Colón. Algunas pocas naciones han tenido también la fortuna de ser proyectadas y organizadas por grandes hombres para los cuales el libro era un artículo de fe. Nuestra nación argentina es hija de ese privilegio. Desde mediados del siglo XIX, letrados como Juan Bautista Alberdi, Domingo Faustino Sarmiento, Bartolomé Mitre, Dalmacio Vélez Sarsfield y Nicolás Avellaneda, entre tantos otros, pensaron con pasión en el país que querían para las generaciones sucesivas. Infinitas veces disintieron en los detalles y polemizaron con acritud, pero las prioridades del modelo argentino fueron, para todos, siempre las mismas: la salud, la educación, la igualdad ante la ley, la modernidad, la apertura de las puertas a la inmigración europea, que entonces era aluvional. Hacia 1850, Sarmiento inició una de las más admirables revoluciones pacíficas del siglo, un torbellino comparable a la marcha de la sal de Gandhi ochenta años más tarde. Lo que propuso Sarmiento fue crear otra vez el país, pero a partir del libro, apagar con civilización los fuegos de la pasada barbarie. "Para tener paz en la República Argentina -escribió- es necesario educar al pueblo en la verdadera democracia, darles a todos lo mismo, para que todos sean iguales." De ese principio nació la ley de educación común, gratuita, laica y obligatoria, que abriría en la Argentina las puertas a la movilidad social, permitiría la expansión de la clase media y sería la fuente de la grandeza que este país alcanzó antes de 1930. En esa tradición crecimos y nos educamos. Y por esa tradición seguimos creyendo, durante tanto tiempo, que el país sería siempre mejor.
Sarmiento puso su obstinación indomable en lograr la sanción de aquella ley. Tropezó durante décadas contra la oposición férrea de la Sociedad de Beneficencia, que regía la educación pública con fondos del Estado. Lo consiguió una década después de abandonar la presidencia de la República, en 1884. Tenía 73 años y le faltaban cuatro para morir. Una Feria del Libro estaba entonces más allá de los sueños de cualquiera de aquellos titanes. Ninguno de ellos habría estado ausente en una ceremonia que recuerda, año tras año, que está nación fue creada no por la espada sino por el libro: la civilización en el desierto infinito dejado por la barbarie.
América latina entera se miró durante décadas en el espejo de nuestros libros: en los que escribíamos y en los que publicábamos. Recuerdo cuánto le admiraba a Gabriel García Márquez, en el invierno de 1967, que las librerías de Buenos Aires estuvieran abiertas hasta altas horas de la noche y que las amas de casa regresaran de los mercados con libros que se compraban como artículos de primera necesidad, junto con las lechugas y el pan de los almuerzos. Dondequiera que fui después en América latina, me encontré con hombres y mujeres que debían su formación a los libros y revistas de la Argentina. Tanto en Barranquilla como en La Habana o en Guadalajara y en Panamá, los libreros ni siquiera tenían tiempo de deshacer los paquetes que les llegaban desde Buenos Aires, porque los lectores se precipitaban ansiosos sobre aquellos volúmenes que les iluminaban el mundo. Los tiempos son ahora otros, y la miseria ocupa en muchos hogares el lugar que tenía antes el conocimiento. Las batallas de estos tiempos de globalización no se libran ya para conquistar nuevos lectores o para crearlos, sino para que el mercado no los deseduque, para que los lectores no pierdan la costumbre de ver el libro como un modo de verse también a sí mismos. Junto con océanos de informaciones por procesar y de libros por leer, la globalización ha engendrado a la vez abismos de desigualdad que antes eran imposibles de imaginar, porque lo que se globaliza es el mercado, no las personas. Una quinta parte de la población del mundo sigue sin tener acceso a forma alguna de educación, y más de los tres quintos restantes no pueden comprar libros, porque la comida, la vivienda y la ropa están primero en la lista básica de las familias y, con frecuencia, lo que se gana ni siquiera alcanza para eso. Mil quinientos millones de personas carecen hoy de agua potable y más de mil millones viven hacinadas en casas miserables, indignas de la condición humana. Mil millones de personas no saben leer ni escribir. En la Argentina, la educación obligatoria de Sarmiento es ahora una utopía más inalcanzable de lo que era hace siglo y medio. Innumerables chicos siguen sin poder ir a la escuela porque tienen que ayudar a ganar el pan de sus padres, y los que van no lo hacen para aprender sino para comer, porque a muchos de ellos la escuela les ofrece la única comida del día.
Aun con recursos inferiores a los que harían falta, desde el Ministerio de Educación se ha emprendido ahora una campaña esperanzadora, tendiente a que cada niño tenga un libro. Sólo en 2005 se han invertido en esa campaña más de cien millones de pesos. Es apenas el comienzo, pero un comienzo mucho más luminoso que el páramo sin salida de las décadas anteriores, cuando, en vez de estimular la lectura, los libros se quemaban, ya fuera en las piras reales que se encendieron en algunos cuarteles, ya en las piras simbólicas de los años 90, cuando las bibliotecas fueron sustituidas por una larga fiesta analfabeta. Sería injusto no advertir la diferencia.
Lamento que una agenda colmada de compromisos (supongo) no le haya permitido al presidente de la República estar ahora con nosotros, porque si bien han llegado hasta aquí algunos miembros de su gabinete, hay muy pocos actos, cada año, en que la presencia del jefe del Estado es insustituible. El de hoy es uno de esos actos, porque así lo enseñan la tradición y el destino de los argentinos. Esta celebración del libro tiene que ver con la nación que fuimos, pero, sobre todo, con la nación que queremos volver a ser: una nación de iguales, en la que todos tengan el mismo derecho a educarse y a vivir dignamente. "Las escuelas son la democracia", escribió Sarmiento. Fuimos fundados por el libro, no por la espada: lo repito. Fueron los libros los que inspiraron a Moreno, a Belgrano, a Sarmiento. La espada desbrozó el camino, pero el libro creó el camino. Sin el libro, ¿hacia qué clase de nación estaríamos yendo? ¿Sobre qué valores estaríamos construyendo los años por venir?
Cuando el poder no lee, el poder no piensa. Las dictaduras militares se negaron a leer. Como los comandantes no leían, lo único que los afectaba era lo que oían. Y, por lo general, oían lo que querían. Con el poder iletrado, no hay diálogo posible: sólo obediencia y monosílabos. Después, durante los años en los que el país fue sometido a un voraz remate, el acto de pensar se volvió ineficaz e inútil. Para prosperar, ya no era preciso leer: es decir, no hacía falta pensar. Se impuso el hábito de la discusión frívola. En vez de debatir ideas, se debatían actos de viveza. ¡Cuánto nos ha costado salir de ese pantano en el que estábamos estancados, huérfanos del libro! ¡Cuánto puede costarnos todavía encontrar un proyecto de nación que nos una a todos! ¡Y qué difícil va a ser lograrlo si no entendemos, como tempranamente lo entendió Sarmiento, que educar al pueblo en la verdadera democracia es permitir que todos aprendan lo mismo para que, al menos en el caudal de oportunidades, todos sean iguales!
El libro regresa ahora a lo que era en sus orígenes: una voz común que vamos creando día tras día. El conocimiento humano ha ido avanzado desde las narraciones en las cavernas a las discusiones en el ágora, y desde los manuscritos de los monjes y de los cortesanos a los tipos móviles de Gutenberg, y desde allí otra vez al ágora en la que todos participamos, a través de construcciones colectivas en la Red, como Wikipedia, esa inacabable enciclopedia a la que todas las culturas entregan su aportes, a través de weblogs o de novelas y poemas que se componen a cien manos. Ahora, como en el pasado, estamos escribiendo entre todos el infinito libro de la especie humana. Pero el libro tal como lo conocemos, es decir, el objeto rectangular de cartón o tela o cuero, dentro del cual hay hojas de papel cubiertas de signos, perdurará y prevalecerá durante mucho tiempo todavía, porque siempre habrá alguien que prefiera una relación de intimidad con un autor de esa manera, a través de las páginas que van cobrando vida mientras se abren. Sea cual fuere la forma que asuma, "la inextinguible voz humana sigue hablando", tal como lo dijo William Faulkner en su discurso del premio Nobel. "La inextinguible voz humana no sólo perdurará, sino también prevalecerá, porque tiene un alma que se expresa en el libro, un espíritu capaz de compasión, y de sacrificio, y de persistencia."
El libro es como el agua. Se le imponen cerrojos y diques, pero siempre termina abriéndose paso. La adversidad parece fortalecerlo. Aun en los peores tiempos, las ideas que después se transformaron en palabras han soslayado las censuras y las mordazas para cantar cuatro verdades y seguir siendo incorruptibles e insumisas cuando a su alrededor todos callan, se someten y se corrompen. Ni el odio de los bárbaros ni la intolerancia de los injustos han podido destruir el libro, porque su memoria es también la memoria de la especie humana. He dicho ya que esta nación es hija del libro antes que hija de sus batallas. Es hija del mandato que Sarmiento dejó hace siglo y medio, "Las escuelas son la democracia", gracias al cual, aun en medio del infortunio, mantuvimos en alto la memoria de nuestra pasada dignidad y la certeza de que tarde o temprano íbamos a recuperarla. El libro nos ha salvado. Salvemos ahora nosotros al libro de la indiferencia de los que mandan, de la ceguera de los que creen que es posible vivir sin él, de la estupidez de los que imaginaron que acabarían con él quemándolo o prohibiéndolo. Salvemos al libro, porque en el libro ha estado siempre lo mejor de nosotros."

Por Tomás Eloy Martínez
Para LA NACION
http://www.lanacion.com.ar/opinion/nota.asp?nota_id=799206
LA NACION | 21.04.2006 | Página 1 | Opinión

13 abril, 2006

34) "Estou sem tempo para ler..." (como ele consegue?)

Crônica:

Inveja
L. F. Verissimo

Sou um invejoso, confesso. Invejo quem pode comer doce, quem consegue dormir em avião, quem fala bonito, quem tem neto, quem sabe programar o 'timer'. Invejo os que têm certeza, os que têm fé e os que têm cabelo.
Mas há um tipo que eu invejo acima de qualquer outro. Um que me desperta admiração e ódio - que são os componentes da inveja - numa escala quase insuportável. É o que diz, geralmente depois de um suspiro revoltante: 'Estou sem nada para ler...' Entende? Não é a queixa de uma privação passageira. Ele não se distraiu e deixou de se suprir de leituras, como se tivesse esquecido de comprar sabão no super. Está implícita na sua lamúria uma crítica à indústria editorial e à classe intelectual, que simplesmente não produziram nada que merecesse sua atenção. Elas são as responsáveis pelo seu tempo ocioso e a sua mesa de cabeceira vazia. Enquanto eu sofro da angústia oposta, a da falta de tempo e das pilhas de livros na mesa de cabeceira - e nas estantes e em qualquer superfície plana da casa. Minha queixa é outra: coisas demais para ler até a minha morte, marcada para 2076, se é que eu acertei o 'timer', sem falar no que ainda pretendo comprar. 'Que inveja' é o único comentário cabível diante da frase do insensível.
Muitas vezes a frase é apenas preâmbulo para um pedido de sugestão de leitura. Para: 'Tens lido algo que preste?' A pergunta pressupõe que você tem os mesmos gostos que ele e lhe dá a oportunidade de brincar de leitor casual também, sem stress. - Já leu o Da Vinci? - Já tentei. Mas daquele tamanho... - E o do Fernando Henrique? - Acho que vou esperar o filme.
Ele tem razão. Não há mesmo nada para ler.
Mas a inveja de quem não tem a angústia dos livros esperando leitura seria mais honesta, no meu caso, se a falta de tempo não fosse culpa minha. Na verdade, tenho inveja de mim mesmo quando lia por prazer e curiosidade e não perdia tanto tempo com jornais, revistas e televisão, que nos aproximam tanto do mundo que roubam nossa perspectiva, e portanto nos informam e deformam ao mesmo tempo. Enquanto as pilhas não param de aumentar.

05 abril, 2006

33) Não é piada: Enclopédia da Pobreza custa US$ 400...

Vejam este anúncio:

Encyclopedia of World Poverty
Edited by: Mehmet Odekon (Skidmore College)
Hardcover: 1412918073
Publisher: Sage Publications, Inc
Estimated Pub Date: 05/2006
Pages: 1500 (3 vols.)

Description:
Poverty is more than just lack of income, it is deprivation from basic capabilities, rights, and freedoms that provide individuals the necessary choices and opportunities they need to lead a life they value. The Encyclopedia of World Poverty provides extensive and current information, as well as insight into the contemporary debate on poverty. The three volumes of this state-of-the-art Encyclopedia contain over 800 original articles written by more than 125 renowned scholars. The entries contributing to this work explore poverty in various regions of the world, and examine the difficulties associated with the definition and measurement of poverty, along with its causes and effects.

Key Features:
* Examines the geographic, political, social, cultural, and other economic characteristics of 191 countries and provides current vital statistics on poverty such as the mortality, disease, literacy, and illiteracy rate for each country
* Addresses the various definitions and measurement techniques of poverty and includes each country’s ranking according to the Human Development Index and the Human Poverty Index, whenever available
* Looks at potential causes of poverty, ranging from discrimination to climate factors such as drought and famine, as well as the potential effects of poverty including vulnerability, insecurity, powerlessness, social exclusion and disqualification, and stigmatization
* Acknowledges the importance of various associations combating poverty such as Civil Society Organizations, Secular Charities, Religious Charities, and Non-Governmental Organizations

The Encyclopedia of World Poverty is an authoritative and rigorous source on poverty and related issues, making it a must-have reference for all academic libraries.

Agora vejam o preço:
List Price: $395.00

02 abril, 2006

32) Convergência macroeconômica no Mercosul: tarefa de Sísifo?

Apresentação ao livro de
Leonardo de Almeida Carneiro Enge:
A Convergência Macroeconômica Brasil-Argentina: regimes alternativos e fragilidade externa
(Brasília: IRBr, 2006).

Caminhos da convergência na globalização
Paulo Roberto de Almeida

Este livro, a rigor, dispensa apresentações. Seu título e subtítulo, assim como seu índice esclarecedor, falam por si mesmos, e eles não poderiam ser mais eloqüentes. O tema, evidenciado no título, a convergência macroeconômica entre os dois grandes sócios do Mercosul, toca num dos mais importantes problemas da interface econômica externa do Brasil, ressaltado pela sua densa relação – que não é só econômica, obviamente – com a vizinha Argentina, nosso principal parceiro no empreendimento integracionista do cone sul e interlocutora incontornável e indispensável no processo de construção de um espaço econômico unificado na América do Sul. Quanto ao subtítulo, ele revela de modo muito claro o ambiente econômico frágil no qual viveram até recentemente ambos países, tendo de operar seus respectivos processos de estabilização num contexto de turbulências internas e externas, em um quadro marcado pela diversidade de regimes cambiais, para não dizer divergência recíproca absoluta, e pela deterioração dos desequilíbrios externos.
Em sua primeira “encarnação”, a de uma dissertação de mestrado no Instituto Rio Branco do Ministério das Relações Exteriores, a monografia cumpriu exatamente o papel que se esperava dela, a de uma conclusão com êxito de uma curta trajetória de formação e aperfeiçoamento para a carreira diplomática. Melhor dito, ela foi além dessa missão e, por isso mesmo, conquistou o primeiro lugar dentre os prêmios previstos, ganhando, assim, um lugar de honra no ainda pequeno panteão das monografias publicadas. Com isso, ela assegurou ao seu autor um merecido estágio na Embaixada do Brasil em Buenos Aires e, por sua própria iniciativa, a oportunidade de continuar seus estudos especializados, desta vez em nível de doutoramento. Em sua presente “encarnação”, sob a forma deste livro, ela deve continuar alimentando um debate tão importante quanto necessário, uma vez que, se o que se pretende com o Mercosul é, efetivamente, conduzi-lo à sua etapa de união aduaneira acabada e daí passar a construir o mercado comum pretendido, o tema coberto pelo autor apresenta-se como central na consolidação daquilo que se poderia chamar, emprestando-se uma famosa expressão da Europa comunitária, de “acquis” mercosuliano, base da futura coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais.

Tive a satisfação intelectual – e o prazer pessoal – de “orientar” esta dissertação, mas de fato ela dispensava quaisquer orientações ou “correções”, tal o domínio que o autor demonstrou ter do tema por ele escolhido. Isto se deve, provavelmente, à excelente formação como economista que ele recebeu nas salas de aula da FEA-USP, sem esquecer de mencionar aqui uma experiência profissional prévia num mercado de trabalho altamente competitivo, como é o da cidade de São Paulo.
Leonardo Enge estava, portanto, plenamente habilitado a destrinchar a problemática por ele escolhida, a situá-la adequadamente no contexto mais vasto da globalização, a identificar os problemas correntes do relacionamento bilateral e os percalços que ainda devem ser superados com vistas a alcançar-se, se tal for possível, a esperada e tantas vezes delongada convergência macroeconômica entre as duas maiores economias da América do Sul, condição necessária, mas não suficiente, para avanços ulteriores no Mercosul e base indispensável da consolidação do processo integracionista na região. E o que traz este livro de importante para o debate e a reflexão ponderada em torno dessa questão?

A obra se compõe de quatro capítulos, que vão do geral ao particular, ou do mais vasto ao mais específico, mas que, na verdade, constituem uma espécie de crescendo, uma vez que se parte do contexto maior da globalização, para examinar em seguida seu impacto sobre a formulação e execução das políticas econômicas em âmbito nacional, o que introduz a discussão das experiências de estabilização no Brasil e na Argentina e abre espaço para o exame conclusivo das bases da integração Brasil-Argentina, isto é, da própria convergência macroeconômica. O subtítulo traduz exatamente o que estava em causa nessas experiências: regimes alternativos (de câmbio) – ou seja, de um lado o Plano de Conversibilidade, de outro o Plano Real – e fragilidade externa, isto é, o ambiente de turbulências financeiras em que ambos os países viveram, tanto de origem externa, como aquelas criadas pelos seus próprios desequilíbrios internos e externos. O fato é que, longe de “convergirem” para um leque de respostas de políticas econômicas coordenadas entre si, cada país concebeu e adotou a solução que melhor parecia adequada às autoridades econômicas nacionais, nos momentos cruciais dos respectivos processos de estabilização econômica, daí derivando diferenças fundamentais na implementação prática desses processos que complicaram ainda mais a busca da convergência, num quadro que era igualmente marcado pelas fragilidades externas, em termos de balanço de pagamentos, e pelos impasses internos em torno das políticas monetárias e cambiais.
Ainda que o próprio autor exclua esta intenção, esta é a história linear, tal como efetivamente se passou na “vida” dos dois países – wie es eigentlich gewesen, diria o historiador alemão Leopold Von Ranke –, da “divergência” econômica entre o Brasil e a Argentina, ao longo de mais de quinze anos desde a redemocratização de meados da década de oitenta. Se não fosse pela excelência, também, da análise econômica, esta monografia teórica – como sublinhado pelo autor – já constituíria, nos seus próprios termos, um belo racconto storico da evolução econômica no cone sul a partir do ínício dos anos noventa do século passado. Mas ela vai além disso, ao acoplar à história desses episódios memoráveis da “crônica econômica contemporânea” dos dois países uma discussão pertinente, e percuciente, dos mais importantes problemas envolvidos, segundo uma dimensão própria a cada um deles, na concepção, formatação legal e na aplicação das políticas econômicas nacionais em condições de forte tensão política e social interna e de grandes pressões externas.

E por que a convergência macroeconômica seria relevante na vida econômica dos dois países e no itinerário futuro do Mercosul? Alguns, talvez por impulsos idealistas ou mesmo por um desejo inconsciente de mimetizar o processo europeu, pretendem que essa convergência é importante para acelerar a chegada da “moeda comum” no Mercosul, como se todas as experiências integracionistas devessem, inevitável ou necessariamente, seja reproduzir o modelo comunitário da UE, seja desembocar fatalisticamente na adoção de uma moeda única, vista como o nec plus ultra das integrações possíveis. A despeito do apelo “popular” que possa ter essa visão, devemos descartá-la de imediato. Não se opera “convergência” apenas para fins da adoção de um mesmo padrão monetário, ainda que a conseqüência lógica de todo mercado comum acabado possa ser, de fato, a abolição desse incômodo que representa o câmbio entre moedas nas fronteiras e a imposição continuada desses pesados custos de transação que já não mais possuem razão de continuar a existir, quando completou-se a liberalização de bens, serviços e fatores produtivos entre dois ou mais países. Brasil e Argentina, e talvez mesmo o Mercosul, chegarão, eventualmente, em algum momento de um futuro ainda imprevisível, a uma moeda comum, mas isso se dará pelo aprofundamento natural e pelo adensamento progressivo dos vínculos recíprocos construídos no processo de integração bilateral e plurilateral – envolvendo ainda a América do Sul –, não tanto pela definição de um projeto político que tenha de ser implementado de cima para baixo pela simples vontade de dirigentes ou tecnocratas.
A convergência macroeconômica entre o Brasil e a Argentina é, ou pelo menos deveria ser, importante em seus próprios termos, não apenas como um dos precedentes indispensáveis ao estabelecimento de uma moeda comum bilateral (a ser oportunamente “quatrilateralizada” no Mercosul, se tal for possível, tendo em vista as peculiaridades do Uruguai como praça financeira aberta). Mesmo que não se conceba essa iniciativa apenas como uma espécie de “camisa de força” a limitar ações intempestivas, por parte de líderes políticos ou mesmo de burocracias governamentais eventualmente volúveis, no sentido de alimentar o caráter já naturalmente errático das políticas econômicas nas condições conhecidas na América Latina nas últimas décadas, mesmo que não fosse para evitar esse tipo de “volatilidade macroeconômica” embutida na instabilidade geral dos ciclos eleitorais nesses países, a convergência macroeconômica apresentaria, por si só, um elemento novo na densa relação econômica já construída entre o Brasil e a Argentina. Esse elemento é, obviamente, o da estabilidade e da previsibilidade de regras, a condição primeira e essencial de todo processo sustentado de crescimento econômico (a segunda sendo, em minha opinião, uma microeconomia competitiva, e a terceira uma abertura ao comércio e aos investimentos internacionais, sem olvidar, obviamente, a qualidade dos recursos humanos e uma infra-estrutura adequada).
De fato, a convergência não é uma “situação” a que se chegue, como seria um eventual ingresso em um “estado de graça” de tipo econômico. Trata-se mais bem de um processo, de um work in progress, que requer das autoridades econômicas envolvidas mais do que atividades rotineiras de troca de informações, consulta e coordenação de medidas tópicas no campo macroeconômico. O processo gradual de que se fala requer, em primeiro lugar, uma concepção clara do tipo de ordenamento econômico que se pretende em países que estão inevitavelmente inseridos na interdependência econômica global, como demonstrado amplamente neste trabalho. Ele demanda, em segundo lugar, uma definição das condições sob as quais os países devem operar internamente e administrar no plano externo essa inserção econômica internacional, o que também é discutido neste livro. Ele está, em terceiro lugar, condicionado à existência de instituições técnicas específicas, ou pelo menos de mecanismos e “ferramentas” adequadas e adaptadas a esse tipo de gestão econômica, que se aproximam daquilo que os anglo-saxões chamam de fine-tuning. As tarefas não são simples, tendo em vista a instabilidade macroeconômica que marcou ambos países nas duas últimas décadas do século XX e a delicada gestão da estabilidade alcançada – mas ainda não totalmente garantida – nos primeiros anos desta década.
Com base num estudo empiricamente sustentado nessas experiências dos últimos lustros, mas também teoricamente embasado na melhor ciência econômica, o autor conclui que o conjunto ideal de políticas para a promoção da convergência macroeconômica entre Brasil e Argentina deveria estar fundamentado no tripé câmbio flexível, metas de inflação e austeridade fiscal. Como diz Leonardo Enge, essa combinação de políticas é a mais adequada para a promoção do crescimento econômico, a atração de investimentos diretos estrangeiros e redução da fragilidade externa no Brasil e na Argentina.
Por acaso, esse tipo de receituário se aproxima do “coquetel” macroeconômico em utilização atualmente no Brasil, mas ele ainda não está suficientemente consolidado e costuma sofrer ataques, tanto à direita, quanto à esquerda do espectro político-acadêmico-tecnocrático que costuma opinar sobre políticas econômicas no Brasil. Existe ainda, como já salientado por diversos observadores que acompanham esse tipo de debate, uma enorme demanda por “magia econômica”, bem como por intervencionismo estatal em determinados mercados e setores.
São vários os efeitos desse tipo de demanda, mas eles costumam se manifestar em ataques simultâneos (nem sempre coincidentes ou todos concordantes): (a) contra a rigidez das metas de inflação, insuscetíveis de acomodar, conforme se lê, determinados choques externos de preços, como no caso do petróleo, pressionado por uma demanda muito próxima da oferta; (b) contra a política de flutuação do câmbio, que limitaria, como apregoado frequentemente, intervenções mais focadas do Banco Central na determinação de uma “taxa de equilíbrio”, que ninguém ainda conseguiu dizer qual seria; (c) ou, ainda, contra o próprio conceito de responsabilidade fiscal, que os mais afoitos querem ver substituído por um etéreo compromisso com o crescimento e o emprego e por um ainda mais vago conceito de “responsabilidade social”, sem falar nos que pretendem a redução do superávit primário em nome de investimentos “sociais”, como se o déficit nominal já não fosse suficientemente alto.

Mas quando se fala em convergência se está pensando, obviamente, numa relação envolvendo pelo menos dois atores, quando não num processo bem mais amplo, com número maior de países, apontando para a confluência de políticas comuns, se não totalmente harmônicas, ao menos concordantes, como tem ocorrido, por exemplo, desde longos anos, no seio da União Européia e, de forma mais diluída, no âmbito da OCDE. O fato de Brasil e Argentina cogitarem, e de certa forma estabelecerem como objetivo, essa convergência, como estabelecido, por exemplo, no artigo 1º do Tratado de Assunção – ainda que sem mecanismos definidos de implementação – já constitui um fator, ou pelo menos uma promessa, de futura estabilidade de regras, a primeira das nossas condições primárias para um processo sustentado de crescimento econômico.
Se uma convergência relativa era sustentada, no regime de Bretton Woods, pela adesão formal ao princípio da estabilidade cambial, essa tarefa tem de ser cumprida, no não-regime monetário que passou a existir no mundo “pós-Bretton Woods”, pela adesão informal a um conjunto de regras e princípios aos quais os países prometem se ater voluntariamente como forma de reduzir a volatilidade intrínseca aos regimes de flutuação cambial. Uma das modalidades encontradas, no caso da experiência monetária européia – que existiu independentemente de acordos formais de integração, já que também o franco suiço, por exemplo, fazia parte de um sistema de flutuação ancorado no antigo deutsche mark –, foi a definição de uma banda ajustável, mas bastante estreita, ligando as moedas integrando esse regime, com acertos de intervenções recíprocas entre bancos centrais para garantir a fiabilidade do sistema. Mas mesmo esse tipo de arranjo informal, que poderia ser concebido para outras experiências similares em outros continentes, tornou-se na prática inviável em virtude da magnitude dos fluxos de capitais e da diversidade de ativos à disposição dos agentes nas atuais condições da globalização financeira. O sistema monetário europeu saltou pelos ares quando confrontado com os enormes deslocamentos provocados por uma alta dos juros no principal operador do regime, algo que pode – e tende – freqüentemente a ocorrer.

Qual a solução para o Brasil e a Argentina? Acredito que este trabalho fornece o essencial das respostas e elas já foram resumidas nos parágrafos precedentes. Vale a pena ler atentamente o que Leonardo Enge tem a dizer sobre a experiência dos dois países, no contexto das crises financeiras da segunda metade dos anos noventa, em especial a da Argentina, no início desta década. A convergência macroeconômica entre os dois países é, por certo, bem vinda e mesmo necessária, mas ela requer condições mínimas para ser bem sucedida e abrir o caminho para o tão desejado processo sustentado de crescimento, com baixas taxas de inflação, reduzida volatilidade intrínseca na interface interna e externa do meio ambiente de negócios e uma boa inserção internacional das duas economias. Entre essas condições, necessárias mas certamente não suficientes, estão o conjunto de políticas preconizadas por economistas experientes e que foram pelo autor aqui explicitadas: câmbio flexível, metas de inflação e austeridade fiscal.
Nessa perspectiva, cada um dos dois países deve avançar muito ainda no caminho da consolidação de seus respectivos processos de estabilização macroeconômica antes de se pensar no estabelecimento de mecanismos formais – no âmbito bilateral ou mesmo “mercosuliano” – de coordenação das políticas macroeconômicas, que constituem a base instrumental da desejada convergência. O Mercosul pode até ser importante, ou até mesmo essencial, nesse processo, mas ele não é necessariamente indispensável, uma vez que o mais relevante é a tomada de consciência, interna, pelos dirigentes econômicos e pelos líderes políticos, de que a escolha das políticas ideais envolve elevado sentido de responsabilidade e um compromisso muito forte com a estabilidade e a previsibilidade das regras.
O Brasil e a Argentina já perderam muito tempo, no decorrer do século XX, no caminho do crescimento econômico e da busca de bem-estar para seus povos respectivos. Nos percalços econômicos registrados e nas muitas frustrações sociais acumuladas, ao longo das últimas décadas, ambos países, de comum acordo, decidiram privilegiar o Mercosul como um instrumento válido de progresso econômico e social, bem como para sua capacitação com vistas a lograr uma melhor inserção econômica internacional. Pois bem, o Mercosul constituiu, desde 2000, um conjunto de diretrizes de procedimento para realizar o objetivo almejado da convergência macroeconômica. As diretrizes são válidas e plenamente adaptadas aos requerimentos estabelecidos para realizar esse processo de convergência, como reconhece o autor deste trabalho, ao cabo de um circunstanciado exame teórico e empiricamente embasado do percurso do Mercosul, no decorrer de mais de uma década. Se os resultados alcançados até aqui não estão em conformidade com os objetivos esperados do itinerário integracionista, não é por alguma falha intrínseca de qualquer uma das diretrizes estabelecidas e sim por deficiências próprias aos dois países, ou seja, pela não implementação do “mix ideal” de políticas econômicas. As regras estão dadas. Cabe persistir no intento, de maneira responsável e serena, que os resultados virão.
A visão clara desse processo, por parte de Leonardo Enge, como revelada neste trabalho, nos permite ostentar uma tal tranqüilidade quanto ao atingimento oportuno dos objetivos de maximização do bem-estar e de progresso econômico e social, fixados na inauguração do Mercosul. Brasil e Argentina ainda têm um longo itinerário a percorrer para que eles sejam alcançados, mas o conhecimento adequado do caminho já cumprido permite constatar os erros cometidos e a serem agora evitados, bem como as tarefas que ainda devem ser empreendidas para a consecução daquelas metas. Uma obra como esta constitui uma espécie de “manual de bordo” da história realizada até aqui, ao mesmo tempo que um “manual de instruções” – uma espécie de how to do – da agenda que tem de ser cumprida por dirigentes responsáveis e engajados nesse processo. Auguro pleno sucesso acadêmico e no espaço público para este primeiro livro de meu colega diplomata Leonardo Enge: tenho certeza de que ele contribuirá para o debate bem informado e, mais do que isto, para a orientação de políticas públicas condizentes com as necessidades dos países membros do Mercosul.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 19 de março de 2006.

31) Desconstruindo Estados (ma non troppo...)

Francis Fukuyama:
Construção de Estados: governo e organização no século XXI
(Rio de Janeiro: Rocco, 2005, 168 p.)

Não houve, no decorrer dos anos 90, uma idéia mais equivocadamente rejeitada (sobretudo pela esquerda) do que o pretenso “fim da história”, que teria sido decretado pelo autor nipo-americano. Até a orelha deste livro incorre no equívoco, ao afirmar que “Fukuyama previu o ‘fim da história’ com a ascensão da democracia liberal e do capitalismo global”.
Nada mais errado, inclusive porque ele não defendia uma tese, mas discutia uma hipótese, e ela vinha seguida de um ponto de interrogação ignorado pelos críticos “de orelha”. Em todo caso, Fukuyama parte agora para o fim dos Estados, ou, pelo menos, dos Estados falidos. Ele parece dar substância intelectual às teses do “novo império”: seria perigoso deixar estados falidos nas mãos de terroristas e traficantes, daí a proposta de colocá-los sob assistência de estados “responsáveis” até que eles possam “melhorar”.
Dito com tal franqueza, parece que ele redigiu o manual do intervencionismo para os propugnadores da “ação preventiva”. Não é bem isso, mas Fukuyama oferece, sim, uma justificativa para revisar Westfália, isto é, os arranjos políticos que se baseiam na soberania absoluta dos estados constituídos. Ele lembra que as bases para a erosão da soberania foram lançadas antes da doutrina Bush, nas intervenções humanitárias dos anos 90. Em face de violações dos direitos humanos, as grandes potências, agindo em nome da legitimidade democrática, têm não apenas o direito, mas o dever de intervir.
Ele coloca claramente sua nova tese: promover a governança dos Estados fracos, melhorar sua legitimidade democrática e fortalecer instituições auto-sustentáveis, passa a ser o projeto central da política internacional contemporânea. É o chamado nation-building, mais fácil de dizer do que fazer, como demonstrado pela experiência macabra do Iraque. Na verdade, construir uma nação é algo virtualmente impossível, ainda que a remodelagem dos Estados seja possível, mesmo se o caso do Haiti também demonstra que, na ausência de forças nacionais comprometidas com o projeto, nenhuma imposição externa é bem sucedida.
Esta é, porém, a parte mais política (e polêmica) do livro, seu terceiro capítulo, no qual ele critica inclusive os falcões republicanos que estão conduzindo a desastrosa experiência de “reconstrução” do Estado iraquiano. Os dois primeiros capítulos tratam da chamada “estatidade” e do “buraco negro” criado pelos Estados fracos. Este é o problema crucial da nossa época, que nunca viu tanta prosperidade e tantos fracassos acumulados. Ele não vê nada de errado no consenso de Washington, reconhecendo que o Estado precisa ser reduzido em certas áreas, mas fortalecido em outras.
Fukuyama estabelece as funções do Estado ao longo de um eixo que parte de funções mínimas (bens públicos, segurança e um pouco de equidade), passa por funções intermediárias (fatores externos, educação, serviços públicos e regulação, com alguma redistribuição social) e chegando a funções ativistas (políticas setoriais e redistribuição de ativos). Em função dessa tipologia, ele divide os estados em diferentes quadrantes, segundo a força das instituições e a amplitude das ações do Estado: infelizmente, muitos estados de países em desenvolvimento assumem muitas funções que não conseguem desempenhar bem. O Brasil é citado como um exemplo de problema com o seu federalismo fiscal, o que pode acarretar déficits orçamentários.
Sua conclusão é a de que o Estado precisa ser menor, porém mais forte, isto é, dotado de instituições capazes de responder aos desafios que são colocados pelo crescimento da economia global.

Paulo Roberto de Almeida

30) Monopólio do saber?

Resenha de
Fernando Antonio Ferreira de Barros:
A tendência concentradora da produção de conhecimento no mundo contemporâneo
(Brasília: Paralelo 15 – Abipti, 2005, 307 p.)

O longo título já revela o conteúdo deste livro, que resulta de uma tese doutoral na UnB. O autor acredita, com muitos outros colegas, que a produção de conhecimento, tanto científico quanto prático, isto é, tecnológico, tende a se concentrar cada vez mais num pequeno grupo de países. Isto é verdade, como também o que já se chamou de “grande divergência”, ou seja, a distância cada vez maior de renda per capita entre os países mais avançados e os mais pobres (China e Índia não obstante).
Isso não invalida o fato, porém, que a maior parte do estoque de conhecimento científico acumulado pela humanidade esteja livremente disponível a quem tiver acesso às redes eletrônicas de dados. Nesse sentido, o mundo nunca foi tão “igualitário” como agora, mas a tendência concentradora é um fato, ainda que isso possa não ser uma perversidade dos “produtores de ciência” e sim o resultado da incapacidade dos mais pobres acompanhar o ritmo da pesquisa e desenvolvimento para fins produtivos. Dotado de metodologias testadas, o autor mapeia esse distanciamento na produção de ciência e tecnologia nos mais diversos países, dedica um capítulo aos países emergentes, em especial ao Brasil, identifica as razões das desigualdades e faz recomendações na linha do que já propôs o Interacademy Council para reforçar a C&T em todos os países.
Certa visão conspiratória transparece de sua adesão às teses de Ha-joon Chang (Chutando a escada), que acha que os países desenvolvidos querem impedir os menos avançados de alcançá-los e por isso recomendam receitas neoliberais que eles mesmos não seguiram nos seus processos de industrialização. Os fundamentos metodológicos e empíricos desse tipo de raciocínio já foram contestados, o que não impede sua boa recepção nos meios acadêmicos opostos ao mainstream economics.
As teses desenvolvimentistas já receberam muitas ressalvas, mas suas bases continuam intactas, como revelado no movimento anti-globalizador. O autor não diz, exatamente, que “um outro mundo científico é possível”, mas ele talvez gostasse que isso ocorresse segundo as vias tradicionais do investimento estatal e da coordenação das agências públicas com o capital privado. Talvez falte um pouco de confiança na capacidade da própria sociedade se organizar para produzir o saber científico, mas isso começa pela impulsão da educação de base, não necessariamente pelo pródigo apoio à superestrutura algo elitista da comunidade científica. Em todo caso, vale a pena conferir os dados do problema.

Paulo Roberto de Almeida
(Brasília, 1536, 18 janeiro 2006)

29) A educação é cara?; experimente a ignorância...

Resenha de
Gustavo Ioschpe:
A ignorância custa um mundo: o valor da educação no desenvolvimento do Brasil
(São Paulo: Francis, 2004, 234 p.).

A frase é do presidente de Harvard, respondendo a acusações quanto ao custo da universidade. Ninguém que já esteja no ensino superior tentará a via alternativa, obviamente, o que promete reclamações contínuas e custos crescentes no terceiro ciclo, tanto para as famílias quanto para os governos. Todos os países desenvolvidos possuem universidades de primeira linha, mas eles também exibem qualidade aceitável nos dois ciclos anteriores, o que não parece ser o caso do Brasil.
Quanto o autor deste livro propôs, em 1997, a cobrança de mensalidades dos alunos abastados das universidades públicas, as reações foram inusitadamente fortes, comprovando que ele tocara em um ponto caro (e como) às classes médias. Afinal de contas, elas já tinham sido obrigadas a pagar pelos dois ciclos precedentes em instituições privadas e agora querem usufruir o que existe de melhor na educação brasileira. Mas o importante a ser ressaltado no excelente livro de Ioschpe é que o ensino superior não é um problema para o Brasil, ou pelo menos este não é O problema, ainda que nossos indicadores a esse respeito nos coloquem abaixo da média dos países em desenvolvimento e muito aquém dos países da OCDE. A grande questão, no entanto, é a má qualidade do ensino nos dois primeiros ciclos.
Para situar os problemas da educação no Brasil, o autor não esconde o seu pessimismo: “estamos pior do que se poderia imaginar” (p. 132). Na primeira parte ele traçou um quadro abrangente sobre o papel da educação no crescimento – mostrando o impacto altamente relevante dessa variável no desempenho econômico relativo dos países, com base em amplo espectro de estudos especializados –, o que lhe permite fazer um diagnóstico muito preciso desses problemas no Brasil. A situação é estarrecedora: não só temos poucos jovens nas escolas, mas os testes aplicados, tanto internamente como no contexto de programas da OCDE, dão resultados só pífios e caminhando para pior.
Uma frase resume o sentido de sua crítica. “No Brasil, um país onde a educação é um dos principais responsáveis pela desigualdade de renda, assiste-se a uma grande mistificação sobre o assunto, em grande parte porque aqueles que se dizem esquerdistas e igualitaristas no discurso acabam defendendo, na prática, um modelo elitista e exclusivista que mantém e protege as desigualdades reinantes” (p. 158). A solução não está em aumentar a oferta de vagas nos níveis mais baixos (já perto de 100%), mas sim a de concluintes capazes de entrar nos segundo e terceiro ciclos e a única solução para isso é “aumentando a qualidade dos níveis mais baixos de educação” (p. 161).
Antes de propor a reforma completa do ensino no Brasil, não custa nada eliminar alguns mitos, como por exemplo o de que o Brasil gasta pouco em educação. Não: gastamos mais (5,1% do PIB) do que a média da OCDE (4,9%). Colocar mais dinheiro seria aumentar a ineficiência do sistema. Os professores tampouco ganham mal, para o número de horas efetivamente trabalhadas, ao contrário: eles ganham um pouco mais do que outros profissionais de mesmo nível de qualificação, sem falar das outras benesses do serviço público (estabilidade, melhor pensão, menos anos para aposentadoria etc.). Descobre-se que o Brasil gasta dinheiro nos níveis errados, com prioridades erradas.
Alguns dados, entre outros: “os universitários de instituições públicas representam menos de 2% das matrículas da educação do Brasil, mas recebem 29% dos gastos públicos destinados à educação” (p. 183). O custo por aluno é quase o dobro da média da OCDE, a relação aluno-professor é inferior, a formação leva mais tempo e o professor universitário recebe por uma pesquisa que ele não faz. No Brasil, o custo de um aluno universitário do setor público pode ser 4 a 9,5 vezes mais do que o similar do setor privado, contra uma média internacional de 2,3 para 1 (p. 189).
Quanto à reforma do ensino no Brasil, não é que faltem metas: os MEC as tem demais. A proposta do autor é que o Brasil tenha 66% de taxa de escolarização líquida no segundo ciclo até 2014, ou seja, que 2/3 dos jovens de 15 a 17 anos tenham ensino médio. Para isso é preciso alfabetizar todas as crianças ao final da primeira série e a dificuldade, aqui, é mais gerencial do que pedagógica. É preciso melhorar a qualidade do ensino e redirecionar os recursos dos abonados do terceiro ciclo para os pobres do primeiro.
O plano de reformas do autor compreende a ampliação do FUNDEF, cobrindo o ensino médio (FUNDEB), a premiação da melhoria do desempenho nos estados e municípios, o fim do abatimento no imposto de renda dos gastos em escolas privadas e o fim da gratuidade no ensino superior, com transferência desses recursos para o FUNDEB. A distribuição do dinheiro adicional deve premiar não aqueles que menos têm, mas os que melhorarem seu desempenho, relativamente. Segundo ele, o novo fundo “deveria transferir recursos de acordo com a diminuição das taxas de repetência de cada estado” (p. 223). O fim da gratuidade no ensino superior público é, obviamente, o grande elefante no meio da sala: “o estrangulamento nacional não deve acabar enquanto a universidade pública não se tornar mais eficiente e menos custosa, para que possa voltar a se expandir” (p. 231). O dinheiro arrecadado não seria para cobrir os custos da própria universidade, mas sim deve ser transferido para o ensino básico.
As universidades públicas teriam permissão para cobrar o que achassem compatível com sua estrutura de custos, e segundo os cursos mais requisitados. Os alunos carentes teriam ajuda governamental garantida, dentro de certos parâmetros, e o resultado seria uma melhoria da qualidade tanto no setor público como no privado. As propostas são ousadas e dignas de reflexão, quando não de implementação imediata. A pior coisa seria maior transferência de recursos para as universidades públicas, sem a contrapartida da melhoria na eficiência. O Brasil já gasta muito nas prioridades erradas. Deve-se agora fazer o que tem de ser feito, que é o que já foi feito em outros países. Este livro é uma boa introdução a esse debate.


Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 22 janeiro 2006, 3 p.

01 abril, 2006

28) Conflitos laicismo-religiao na Europa, da Revolução Francesa à Primeira Guerra Mundial

EARTHLY POWERS
The Clash of Religion and Politics in Europe From the French Revolution to the Great War
.
By Michael Burleigh.
Illustrated. 530 pp. HarperCollins Publishers. $29.95.

Godless Europe
Review by MARK LILLA
The New York Times, Book Review, April 2, 2006

Among the many stories Europeans tell about themselves, none is more tenacious than the legend of Europe's secularization. It goes something like this. After many dark centuries of cultural backwardness and political tyranny sanctified by Roman Catholicism, followed by a period of maniacal confessional conflict set off by the Protestant Reformation, Europe in the 17th century began a slow but steady exit from religion. By the 18th century the leading lights of the Enlightenment had issued a public declaration of independence from God and his priests, which then became a battle plan for the war of attrition against religion that began with the French Revolution.

The outcome of this conflict was settled from the start, and already in the early 19th century the center of gravity in European life had shifted from problems of faith to those of class, industrialization, urbanization, nationalism and colonialism. The "long" 19th century, from the French Revolution to World War I, culminated in a crisis involving all these new factors, and the result was total war in the 20th. After this catastrophe, Europe was divided geographically and ideologically, but still unified in believing that the challenge of religion was over. Since World War II, Europeans have stared in blank amazement across the Atlantic at a new global power whose citizens and even leaders seem to believe myths about the old bearded man in the sky. They call this American "exceptionalism," on the assumption that living without God is the ultimate destiny of the human race.

Things change. Today we can be forgiven for thinking that Europe, not the United States, is the exception. Wherever we now cast our gaze around the globe, we are met with the spectacle of individuals and whole cultures set spiritually ablaze, and eager to spread the flame to others. The Old World is different: though Christian belief remains strong in some European countries, like Poland, and Islam is a potent force among Muslims across the Continent, contemporary Europe is the closest thing to a godless civilization the world has ever known. Does this place it in the vanguard of world history? That is what many Europeans think, which is why they have been caught off guard by the challenge of radical Islam even in their own backyard. They find it hard to believe that people can still take God seriously and want to shape society according to his dictates.

Yet it was not so long ago that the problem of religion was central to European intellectual and political life, too. Contrary to the legend of steady secularization, 19th-century Europe was seriously divided over the problem, though in a new way. While 19th-century Protestant America was searching for God by immersing itself in the Bible, experiencing one Great Awakening after another, Europe entered an age of anxiety over the prospect of living in a disenchanted cosmos. Was modern man progressively recovering the powers he once projected onto gods, building for himself a fully human world? Or was religion going to re-emerge from the challenge of modernity like a phoenix from the fire, purified by rational analysis of its moral doctrines and shorn of its myths by sound historical scholarship? Did the disappearance of old forms of worship mean the destruction of traditional social bonds, foreshadowing a dark, atomized future? Or was it mere prelude to the founding of a new kind of religion animating a new kind of society, a utopia in which human beings would finally be reconciled to themselves and with one another? These were the great questions haunting the European mind throughout the 19th century, questions that have returned to haunt us now.

As Michael Burleigh disarmingly admits in the introduction to "Earthly Powers," he tripped across these questions while hunting other game. Burleigh is an accomplished popular historian specializing in Germany, and is the author of the award-winning book "The Third Reich: A New History" (2000). In this work he casts his net more widely over the whole of Western Europe in the long 19th century. As he states in the introduction, he set out to write a study of totalitarianism as the continuation of modern attempts to reshape human nature through what he calls "political religion," beginning in the civic cults and festivals instituted in postrevolutionary France. What opened up instead was the whole rich landscape of 19th-century religious and political thought, to which he has now devoted an entire volume. An earlier generation of intellectual historians writing after World War II — Isaiah Berlin, Jacob Talmon, Frank Manuel, Paul Bénichou — shared Burleigh's intuition that the seeds of Europe's collapse in the 20th century were planted in this landscape. His book is not in their league, relying more on secondary reading than on firsthand familiarity with the most important figures of the period. It is also a surprisingly messy work with no clear thesis to advance, lazily written in patches and in dire need of editing. Still, it is a useful contribution in the present moment, reminding us about some forgotten thinkers who were grappling with remarkably contemporary problems.

"Earthly Powers" begins with a potted history of the French Enlightenment attack on religion and the bloody suppression of the church by the Jacobins after the revolution. There is little new here and it is curious that Burleigh, who resides in England and is an expert on Germany, does not complicate the picture by reminding readers how very different was the approach to religion in the British and German Enlightenments. But he is right to see radical French atheism setting the stage for the drama that unfolded just after the revolution, when the Jacobins went to war against Catholicism, destroying churches, imprisoning priests and nuns or sending them into exile, and brutally suppressing spontaneous Catholic uprisings that took place across France. Yet it turned out the Jacobins were not opposed to religion as such, just to the Catholicism that had sanctified centuries of tyranny. Having studied Jean-Jacques Rousseau's "Social Contract," they were convinced that a strong republic would need some sort of civil religion to establish a spirit of self-sacrifice and belonging, and so they tried to create one, organizing public festivals modeled on pagan cults and remaking the calendar. Burleigh, like so many historians today, sees in these Promethean efforts a premonition of the theatrical mass meetings of the 20th-century Bolsheviks, Fascists and Nazis.

The French Revolution, then, raised two specters simultaneously across the whole of Europe: of a world without religion, and a world with new, improved religions. Both outcomes are consistent with the ambiguous term "secularization." Sometimes the word is used to describe a process of laicization: when a court system, for example, moves from enforcing biblical injunctions to enforcing laws passed by a parliament after public debate, we say it has been secularized. But sometimes we use the word to describe a supposed transfer of religious essence from a divine object to a human one, as when a nation's founder is worshiped as a "secular" god. (Think of Mao in the Yangtze River, or Lenin's tomb.) Burleigh never makes clear whether he thinks Europe was secularized in the first sense, the second or both — though, to be fair, neither did the authors he discusses. Instead, like trauma victims, they kept returning to the French Revolution as the source of all their hopes and fears. It became an enormous screen upon which all sorts of fantasies about religion and politics could be projected.

Three classes of fantasies appear in the rich material collected in "Earthly Powers." One, perhaps the most familiar to us and most current in Europe today, was that religious sentiments would progressively atrophy in a democratic world of equal citizens, free scientific inquiry and public education. When this proved not to be the case, secular forces in France's Third Republic and Bismarck's Germany took matters into their own hands by trying to drive every last vestige of the Catholic heritage out of the educational establishments, leaving scars that can still be seen in the body politic. As the German proverb has it, was soll nicht sein, kann nicht sein: what should not be, cannot be.

A second fantasy, also consistent with the proverb, was of a return to Catholic orthodoxy, to the secure realm of church doctrine that the Reformation had weakened and the revolutionaries had tried to destroy. This essentially was the Vatican's policy throughout much of the 19th century, particularly under the reign of Pope Pius IX, who defiantly issued a syllabus of heretical modern errors, declared the novel dogma of papal infallibility and even recognized the once heterodox doctrine of the Virgin Mary's Immaculate Conception. To the extent that there was a "clash of religion and politics in Europe," as Burleigh's subtitle has it, it was conducted by men and women in the grip of these two fantasies.

But a third, and far more consequential, fantasy was being nurtured throughout the 19th century. It portrayed the French Revolution as a kind of fortunate fall or lucky break, a destructive act that swept away all that was irrational, unjust, backward-looking and alienating in Christianity, in order to prepare a renewal of religion in a world aborning. This dream was attractive because it combined realism and idealism in equal measure, accepting the revolution as a fait accompli but seeing in it the promise of redemption through some kind of spiritual rebirth. In Germany this hope was expressed in genteel form by the liberal Protestant theologians, beginning with Friedrich Schleiermacher, who was both a fan of the revolution and something of a German nationalist. Schleiermacher tried to put theology on a new footing by beginning not with divine revelation but with the human religious instinct, from which he derived all the central dogmas of Protestant Christianity. This humanistic reform of theology was seen by his disciples as the intellectual correlate of the political reforms of the postrevolutionary period, raising the prospect of a concordat between Protestantism and modernity. (A similar dream was hatched in Reform Judaism, which Burleigh does not mention.) In other words, a rationally purified biblical faith would jettison old beliefs in miracles and the Bible's literal truth, allowing it to become the civil faith of the bourgeois German state. This proved to be a powerful myth that turned many a Protestant minister into a blinkered German nationalist, contributing in no small measure to the catastrophe of World War I.

But it was in France that the most radical alternatives were explored, in thought and deed. And the most radical thinkers of all were . . . the reactionaries. Revolutions are thrilling events and revolutionaries are exciting to write about (which is why so many books are written about them). Reaction, on the other hand, is an amorphous phenomenon, and those who promote it are, by present-day standards, unsavory. Yet the truth is that some of the deepest minds of the 19th century were those who reacted most forcefully against the revolutionary tide. In intellectual life as in political affairs, defeat concentrates the mind and brings out a boldness that victory rarely elicits; the defeated have nothing to lose. And so it was with the French counterrevolutionaries, who thought they had witnessed an apocalypse.

The most profound of these was undoubtedly the Savoyard writer and diplomat Joseph de Maistre, who welcomed the revolution and the terror as works of divine providence. Europe, he believed, was being prepared for a new religious epoch in which it would be ruled with an iron hand by sovereign popes standing above restored national monarchies. In his last work, the eerie "Saint Petersburg Dialogues," he developed a dark vision of political life as having its foundation in bloody religious rituals, war and cruelty, all used by God to forge strong nations and achieve his providential aims.

As Isaiah Berlin often pointed out, Maistre's 19th-century books read like a syllabus of 20th-century fascist ideas. But his fundamental insights — that political life rests on a religious foundation, that human relations are shaped by ritual, that individualism is a disease — first found their echo among leftist French utopians like Saint-Simon, Charles Fourier and then Auguste Comte. The utopians did not believe in God but they very much believed in religion. That is the truly novel development in the 19th century, and one that Burleigh never manages to bring into focus: the less people talked and worried about God, the more they talked and worried about religion. For the utopians, the revolution's defeat of the Catholic Church represented an enormous step forward for the human race, but also posed an unprecedented challenge. Once men thought themselves free from God they might think themselves free from one another, like elementary particles floating in the void. What modern, postrevolutionary society needed was a new religion, or a surrogate one, a system of symbols and ceremonies bringing individuals together without reference to a revealing, transcendent God.

And so the utopians took out their rulers and compasses and set to work. Saint-Simon imagined the creation of an autocratic technocracy run by industrialists and bureaucrats, and maintained as an organic whole by a new religion of reason. Some of his followers formed a commune outside Paris, where they wore special uniforms and performed secret rites. Comte wrote pamphlet after pamphlet laying out a new "positive" system for society, which would include a "religion of humanity," complete with ceremonies, saints and high holy days. As for the unstable Fourier, he scribbled and drew up an extraordinarily detailed vision of a future world where we would live in small, communal "phalanstaries," sharing work, art, property and sexual partners, brought into harmony by the precise redirection of our passions and the worship of our collective selves. (In the late 1960's, his writings were rediscovered and experienced quite a vogue among students worldwide.)

Burleigh does a marvelous job profiling these colorful characters while still managing to convey the historical importance of their ideas. He also sees how their daydreams about using religion instrumentally to foster social identification took a nightmarish turn at the end of the century when they fell into the hands of rabid nationalists like the French writer Charles Maurras and the German scholar Paul de Lagarde. Here we really are in the presence of the proto-totalitarian political religions Burleigh originally set off to find. But from the material he has collected, they seem less "secularized" versions of genuine faith than products of an obsession with the implications of religion's decline.

At several points in his narrative Burleigh reminds us of Matthew Arnold's lines from "Dover Beach":

The Sea of Faith,
Was once, too, at the full, and round earth's shore
Lay like the folds of a bright girdle furled.
But now I hear
Its melancholy, long, withdrawing roar,
Retreating, to the breath
Of the night-wind, down the vast edges drear
And naked shingles of the world.

It is a powerful image, powerfully expressed. But after reading "Earthly Powers," one can't help wondering what it really means. Was the Sea of Faith ever that full? And is it really destined to retreat from the earth? Or is the melancholy simply that of Arnold and like-minded thinkers as they projected onto the religious history of Europe anxieties about the modern age they found themselves in? Nostalgia, like hope, is a subtle but explosive force in human history, and in modern Europe it has been largely destructive. A "world we have lost" is usually one we never had but which its discoverers would like to create. That is where religion can come in: not as a path to God, but as a dike against the present and a bridge to the future.

The West as a whole, and not just Europe, faces a double political challenge from religion today. One is to realize that the world is full of peoples whose genuine faith in the divine gives them a precise, revealed blueprint for political life, which means that for the foreseeable future they will not enter into the family of liberal democratic nations. Only if we give up the fantasy of a universal historical process driving all nations toward a secular modernity can we face this fact squarely and humanely.

The other challenge is to learn how to distinguish between those whose political programs are inspired by genuine faith, and those whose defense of religion is inspired by a reactionary utopianism having less to do with God than with redirecting the faulty course of history. In radical Islam we find both phenomena today, authentic faith and antimodern fanaticism, shaken together into an explosive cocktail.

And even in the United States we are witnessing the instrumentalization of religion by those who evidently care less about our souls, or even their own, than about reversing the flow of American history since the "apocalypse" of the 60's. Michael Burleigh's book shows how difficult it was for Europe to cope with both these challenges as recently as the 19th century. It is no easier for us today.

Mark Lilla is professor in the Committee on Social Thought at the University of Chicago. His study "The Stillborn God: Religion and the Modern Experiment" will be published early next year.